segunda-feira, 1 de maio de 2017

Pesquisadores sintetizam proteínas que detectam doença de Chagas com maior precisão



Roni Pereira e Melissa Tavares

Pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) sintetizaram proteínas capazes de detectar doenças de Chagas com maior precisão. A informação está no artigo do grupo publicado em 8 de março, na revista especializada em doenças negligenciadas, PLOS Neglected Tropical Diseases.
A doença de Chagas é uma doença causada pelo parasita Trypanosoma cruzi, que é transmitida pela picada do barbeiro. Apesar de ter mais de cem anos de descoberta, pesquisadores ainda enfrentam obstáculos quanto ao diagnóstico desta doença. Ainda há o fato de que o diagnóstico de Chagas é hoje negligenciado e o Ministério da Saúde tem dificuldade em comprar kit comercial.
“O diagnóstico é outro grande problema da doença de Chagas porque o parasita que circula aqui na Bahia tem variações genéticas do parasita que circula em outras regiões geográficas”, explica Fred Luciano Neves Santos, pesquisador do Instituto e um dos autores do estudo. “O teste que apresentar um bom desempenho aqui na Bahia não pode ser bom para os indivíduos de outros estados ou países por conta das variações genéticas do parasita”.
Outro obstáculo é referente ao parasita Leishmania, que causa a doença leishmaniose. Este parasita é muito similar ao Trypanosoma cruzi, e como é muito frequente em regiões, como a Bahia, por exemplo, existe a possibilidade dos testes diagnósticos reconhecerem pacientes que têm outras doenças como um indivíduo com doença de Chagas.
“Nessas áreas onde há circulação da leishmaniose e da doença de Chagas muitas vezes, pela similaridade dos parasitas, pode haver confusão: o individuo pode estar com leishmaniose e se eu fizer um diagnóstico de Chagas nele, pode dar positivo, pois os parasitas se parecem”, explica Fred.
Segundo o pesquisador, o maior desafio é produzir kits diagnósticos capazes de detectar pessoas com doença de Chagas, independente de região onde vivem. Para ajudar nisso, os pesquisadores da Fiocruz utilizaram de proteínas sintéticas, que são construídas por sequências repetitivas de diversas proteínas do corpo do parasita.
“As sequências utilizadas para compor essas novas moléculas foram cuidadosamente escolhidas, com o objetivo de torná-las eficientes em atrair os anticorpos que o organismo produz contra o Trypanosoma cruzi”, explica o pesquisador. “Quando a presença desses anticorpos é detectada em amostras de sangue de pacientes, pode-se confirmar os casos da infecção”.
Moléculas do parasita são formadas por sequências repetitivas de aminoácidos. “Várias sequências dessas proteínas são exatamente iguais e isso faz as moléculas ficarem mais antigênicas, ou seja, ficam mais reconhecidas pelo sistema imune”, afirma. “O sistema imunológico começa, então, a produzir anticorpos específicos direcionados para essas regiões repetitivas”.
Os pesquisadores juntam em uma única proteína sintética essas sequências repetitivas de proteínas do parasita e formam uma quimera (combinação de diferentes elementos). Por isso o termo “sintetizar”. Isso permite que se tenha uma maior capacidade de identificar positivos (pessoas cujo teste afirma que tem doença de chagas) dentro de número amostral de positivos.

O estudo
O estudo se divide, até o momento, em duas fases. Na fase I, o objetivo é descobrir se a proteína consegue diferenciar indivíduos positivos de negativos para a doença. A fase II é mais complexa, pois um há maior contingente de amostras tanto para positivos quanto para negativos e ainda é preciso avaliar diversos parâmetros de desempenho, como a sensibilidade, especificidade e precisão.
O estudo focou em avaliar, principalmente, os parâmetros de sensibilidade, que é a maior capacidade de identificar indivíduos positivos dentro do contingente de pessoas que realmente possuem a doença, e a especificidade, que utiliza do mesmo raciocínio da sensibilidade, mas para negativos. “Esse estudo foi feito e vimos que as quatro proteínas diferenciam os positivos dos negativos”, diz Fred.

Gráfico compara as moléculas dos pesquisadores com kits comerciais utilizados em laboratório. O kit ideal é aquele que seja 100% sensível e 100% específico. Quanto maior o valor do Diagnostic Odds Ratio (DOR), melhor. O Ministério da Saúde define que um teste bom para Chagas é aquele está acima da linha (entre o 98% e 100%). A molécula 8.4 conseguiu superar a linha. Fonte: PLOS Neglected Tropical Diseases.

O artigo publicado em 8 de março destacou o parâmetro de desempenho conhecido como precisão. “Ele vai nos dizer o quão certo estão os nossos resultados em diagnosticar positivos e negativos. Então ele analisa a sensibilidade e especificidade conjuntamente. Caso seja 100% significa que meu teste é 100% exato, ou seja, conseguiu identificar todos os indivíduos negativos  como negativos e todos os positivos como realmente positivo”, explica Fred.
Segundo Fred, das quatro proteínas sintéticas, duas, a 8.1 e a 8.4, apresentaram maior exatidão. “Por isso são excelentes candidatas para testes diagnósticos. Provavelmente serão essas duas moléculas que futuramente faremos um teste diagnóstico para Chagas no Ministério da Saúde”, afirma o pesquisador.

Se obtiver sucesso, Biomanguinhos (Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos, da Fiocruz) voltará a produzir kits diagnósticos para Chagas e o Ministério da Saúde fornecerá esses kits para rede pública a nível nacional. 

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