Roni
Pereira e Melissa Tavares
Pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)
sintetizaram proteínas capazes de detectar doenças de Chagas com maior
precisão. A informação está no artigo do grupo publicado em 8 de março, na
revista especializada em doenças negligenciadas, PLOS Neglected Tropical
Diseases.
A doença de Chagas é uma doença causada pelo parasita
Trypanosoma cruzi, que é transmitida pela picada do barbeiro. Apesar de ter
mais de cem anos de descoberta, pesquisadores ainda enfrentam obstáculos quanto
ao diagnóstico desta doença. Ainda há o fato de que o diagnóstico de Chagas é
hoje negligenciado e o Ministério da Saúde tem dificuldade em comprar kit
comercial.
“O diagnóstico é outro grande problema da doença de Chagas
porque o parasita que circula aqui na Bahia tem variações genéticas do parasita
que circula em outras regiões geográficas”, explica Fred Luciano Neves Santos,
pesquisador do Instituto e um dos autores do estudo. “O teste que apresentar um
bom desempenho aqui na Bahia não pode ser bom para os indivíduos de outros
estados ou países por conta das variações genéticas do parasita”.
Outro obstáculo é referente ao parasita Leishmania, que
causa a doença leishmaniose. Este parasita é muito similar ao Trypanosoma cruzi, e como é muito
frequente em regiões, como a Bahia, por exemplo, existe a possibilidade dos
testes diagnósticos reconhecerem pacientes que têm outras doenças como um
indivíduo com doença de Chagas.
“Nessas áreas onde há circulação da leishmaniose e da
doença de Chagas muitas vezes, pela similaridade dos parasitas, pode haver
confusão: o individuo pode estar com leishmaniose e se eu fizer um diagnóstico
de Chagas nele, pode dar positivo, pois os parasitas se parecem”, explica Fred.
Segundo o pesquisador, o maior desafio é produzir kits
diagnósticos capazes de detectar pessoas com doença de Chagas, independente de
região onde vivem. Para ajudar nisso, os pesquisadores da Fiocruz utilizaram de
proteínas sintéticas, que são construídas por sequências repetitivas de diversas
proteínas do corpo do parasita.
“As sequências utilizadas para compor essas novas moléculas
foram cuidadosamente escolhidas, com o objetivo de torná-las eficientes em
atrair os anticorpos que o organismo produz contra o Trypanosoma cruzi”, explica o pesquisador. “Quando a presença
desses anticorpos é detectada em amostras de sangue de pacientes, pode-se
confirmar os casos da infecção”.
Moléculas do parasita são formadas por sequências repetitivas
de aminoácidos. “Várias sequências dessas proteínas são exatamente iguais e
isso faz as moléculas ficarem mais antigênicas, ou seja, ficam mais reconhecidas
pelo sistema imune”, afirma. “O sistema imunológico começa, então, a produzir
anticorpos específicos direcionados para essas regiões repetitivas”.
Os pesquisadores juntam em uma única proteína sintética
essas sequências repetitivas de proteínas do parasita e formam uma quimera
(combinação de diferentes elementos). Por isso o termo “sintetizar”. Isso
permite que se tenha uma maior capacidade de identificar positivos (pessoas
cujo teste afirma que tem doença de chagas) dentro de número amostral de
positivos.
O
estudo
O estudo se divide, até o momento, em duas fases. Na fase
I, o objetivo é descobrir se a proteína consegue diferenciar indivíduos
positivos de negativos para a doença. A fase II é mais complexa, pois um há
maior contingente de amostras tanto para positivos quanto para negativos e
ainda é preciso avaliar diversos parâmetros de desempenho, como a
sensibilidade, especificidade e precisão.
O estudo focou em avaliar, principalmente, os parâmetros de
sensibilidade, que é a maior capacidade de identificar indivíduos positivos
dentro do contingente de pessoas que realmente possuem a doença, e a
especificidade, que utiliza do mesmo raciocínio da sensibilidade, mas para
negativos. “Esse estudo foi feito e vimos que as quatro proteínas diferenciam
os positivos dos negativos”, diz Fred.

Gráfico compara as moléculas dos pesquisadores com kits
comerciais utilizados em laboratório. O kit ideal é aquele que seja 100%
sensível e 100% específico. Quanto maior o valor do Diagnostic Odds Ratio (DOR),
melhor. O Ministério da Saúde define que um teste bom para Chagas é aquele está
acima da linha (entre o 98% e 100%). A molécula 8.4 conseguiu superar a linha.
Fonte: PLOS Neglected Tropical Diseases.
O artigo publicado em 8 de março destacou o parâmetro de
desempenho conhecido como precisão. “Ele vai nos dizer o quão certo estão os
nossos resultados em diagnosticar positivos e negativos. Então ele analisa a
sensibilidade e especificidade conjuntamente. Caso seja 100% significa que meu
teste é 100% exato, ou seja, conseguiu identificar todos os indivíduos
negativos como negativos e todos os
positivos como realmente positivo”, explica Fred.
Segundo Fred, das quatro proteínas sintéticas, duas, a 8.1
e a 8.4, apresentaram maior exatidão. “Por isso são excelentes candidatas para
testes diagnósticos. Provavelmente serão essas duas moléculas que futuramente
faremos um teste diagnóstico para Chagas no Ministério da Saúde”, afirma o
pesquisador.
Se obtiver sucesso, Biomanguinhos (Instituto de Tecnologia
em Imunobiológicos, da Fiocruz) voltará a produzir kits diagnósticos para
Chagas e o Ministério da Saúde fornecerá esses kits para rede pública a nível
nacional.
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